No dia 22 de fevereiro, o Cineclube Araucária abre a temporada 2014 de bons
filmes em Campos do Jordão com uma programação que homenageia os 100 anos do cinema
criado por um dos seus maiores gênios: Sir Charles Spencer Chaplin ou
simplesmente Charlie Chaplin, ou ainda Charlot ou Carlitos como o conhecemos no
Brasil. Chaplin estreou como ator de cinema em Making a living, de Henry Lehrman, curta metragem de 13 minutos, lançado nos Estado
Unidos há exatos 100 anos, no dia 2 de fevereiro de 1914. Chaplin tinha
então 24 anos e ainda não havia criado o visual que o imortalizou. Mas, como
costumava acontecer na época, Making a living – traduzido no Brasil
para Carlitos Repórter – se caracteriza por muita correria em uma sequência de
situações engraçadas. A produção é modesta, assim como todos as outras feitas durante
o tempo em que trabalhou para a Keystone Film Company, detentora do seu
primeiro contrato artístico. No filme, Chaplin faz um vigarista que aceita um
emprego como repórter. Ao presenciar um acidente, ele pega a câmera de outro
repórter e corre para o jornal a fim de entregar as fotos como suas. Com a
exibição dessa verdadeira relíquia na sede da AMECampos (Rua Dr. Reid nº
68, no sábado – dia 22/02 – às 20h00), seguida do clássico Tempos Modernos, o Cineclube Araucária dará por aberta a sua programação deste ano.
Carlitos
Repórter serviu para que ele chegasse a seu famoso personagem, o vagabundo, pois sua primeira aparição
ocorreu logo no segundo filme, Kid
Auto Races in Venice (Corrida de Automóveis). A produção dos filmes curtos e mudos da época era
realmente industrial. Só em 1914, Chaplin participou de 35 filmes, tendo sido
roteirista e diretor de 21 deles. Em vários, foi o vagabundo, em outros, fez diversos personagens, quase sempre
cômicos.
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Cena de Making a Living (Carlitos Repórter) - primeiro filme de Charles Chaplin lançado em fevereiro de 1914 |
Chaplin nasceu em 1889 em Londres.
Sempre sentiu-se atraído pelo music
hall o que o levou a trabalhar como ator numa excursão pelos EUA com a trupe
de Fred Karno quando, no final de 1913, foi notado por Mack Sennett, que o
contratou para seu estúdio, a citada Keystone. Inicialmente, ele teve
dificuldades para se adaptar ao cinema. Quando viu Carlitos
Repórter, Sennett pensou que cometera um erro ao contratá-lo. Foi Mabel Normand
— atriz e comediante da Keystone — que o convenceu a dar a Chaplin uma segunda
chance. Ela, aliás, escreveu e dirigiu vários de seus primeiros filmes. Só que
Chaplin detestava ser dirigido por mulheres e as discussões entre os dois eram
frequentes. Por outro lado, os filmes faziam tanto sucesso que ele se tornara
uma das maiores estrelas do estúdio. O esquema das produções era sempre o
mesmo: ou seja, o mais desbragado pastelão.
Porém, em 1915, Chaplin assinou um
contrato mais vantajoso com a Essanay Studios. Seus filmes ficaram mais
autorais, já com a pitada de sentimentalismo que o caracterizaria. Ali, Chaplin
também passou a manter um elenco fixo, no qual estavam a heroína Edna Purviance
e os vilões cômicos Leo White e Bud Jamison.
Como os EUA dos anos 10 eram uma
Torre de Babel com imigrantes chegando de todas as partes do planeta, os filmes
mudos de Chaplin atravessavam as barreiras de linguagem, sendo compreendidos
por todos. Nesse contexto, ele se tornou uma celebridade, passando a almejar o
controle total sobre sua produção. Em 1916, a Mutual Film Corporation pagou a
ele 670 mil dólares para produzir uma dúzia de comédias durante o período de
dezoito meses. Um exemplo da nova fase é o clássico Easy
Street.
Em 1917, Chaplin migrou novamente,
assinando um contrato com a First National para produzir oito filmes. Além de
manter a autonomia conquistada, a empresa financiaria e distribuiria os filmes,
além de lhe dar mais tempo para trabalhar. Concentrando-se na qualidade,
construiu seu próprio estúdio em Hollywood e expandiu alguns de seus projetos
para longas metragens. Foi quando, em 1921, produziu a sua primeira comédia
dramática, The Kid (O Garoto), filme
que garantiu status de estrela das telas ao ator mirim Jackie Coogan. Na
sequência, o inquieto Charlie Chaplin, não querendo mais depender do
financiamento e da distribuição de empresas externas, fundou a United Artists
com Mary Pickford, Douglas Fairbanks e D. W. Griffith. Até o início da década
de 1950, todos os longas de Chaplin foram distribuídos pela United Artists. As
obras primas vinham em série, como Em
Busca do Ouro (1925) e O Circo (1928).
Apesar do cinema falado ter
se tornado o modelo dominante no final da década de 20, Chaplin ainda resistiu
até 1940. Durante o avanço dos filmes sonoros, produziu Luzes da Cidade (1931) e Tempos Modernos (1936). Esses filmes ainda eram mudos, ou talvez falsamente mudos, pois possuíam música sincronizada e
efeitos sonoros.
Tempos
Modernos contém falas provenientes de objetos inanimados, como rádios ou
monitores de TV. Isto foi feito para agradar o público da década de 1930, que
já havia perdido o hábito de assistir a filmes mudos. Além disso, Tempos
Modernos foi o primeiro filme em que a voz de Chaplin é ouvida (no final do
filme, na canção Smile, composta e cantada pelo próprio em
dueto com Paulette Goddard). No entanto, a maioria dos espectadores o
considerou um filme mudo que marcava o fim de uma era.
O primeiro filme falado de
Chaplin, O Grande Ditador (1940), foi
um libelo contra o ditador alemão Adolf Hitler e o nazismo. Seu lançamento
ocorreu um ano antes dos Estados Unidos abandonarem sua política de
neutralidade para entrar na Segunda Guerra Mundial. Chaplin interpretou o papel
de Adenoid Hynkel, ditador da fictícia Tomânia. O personagem era claramente
baseado em Hitler e Chaplin, atuando em um papel duplo, também fazia o papel de
um barbeiro judeu perseguido por nazistas. O filme contou com a participação de
Paulette Goddard no papel de uma mulher judia do gueto e de Jack Oakie no papel
de Benzino Napaloni, ditador de “Bactéria”: uma sátira ao ditador italiano Benito
Mussolini e ao fascismo de um modo geral. Dentro do ambiente político da época,
o filme foi visto como um ato de coragem, tanto por seu ataque ao nazismo
quanto pela clara representação de personagens judeus perseguidos de forma
violenta. O Grande Ditador foi indicado
ao Oscar de Melhor Filme, Melhor Ator (Chaplin), Melhor Ator Coadjuvante
(Oakie), Melhor Trilha Sonora (Meredith Willson) e Melhor Roteiro Original
(Chaplin).
Fora das telas, Chaplin
fez parte do glorioso grupo de humanistas democratas da primeira metade do
século XX, gente cujas opiniões eram ouvidas e consideradas como se fossem
reservas morais da sociedade. Apesar de ser batizado pela Igreja da Inglaterra,
Chaplin sempre se declarou ateu. Durante o período nazista, houve grande
controvérsia a respeito de sua suposta ascendência judaica. Propagandas
nazistas da década de 40 o retratavam como judeu. Investigações do FBI no final
da década de 1940 também se concentraram nas suas origens étnicas. Mas não há
documentos comprobatórios e, durante toda sua vida pública, Chaplin se recusou
a tocar no assunto.
Em todo caso, o
posicionamento político de Chaplin sempre foi de esquerda. Durante a era
macarthista, foi acusado de “participar de atividades antiamericanas” e de ser
comunista. J. Edgar Hoover instruíra o FBI a mantê-lo sob observação. A pressão
do FBI para que Chaplin saísse dos EUA alcançou nível crítico no final da
década de 1940, após o lançamento de Monsieur Verdoux (1947), considerado
uma afronta ao sistema capitalista. O filme foi mal recebido e boicotado em
várias cidades dos EUA, obtendo maior êxito na Europa, especialmente na França.
Naquela época, o Congresso cogitou chamá-lo para um interrogatório público,
fato que não se concretizou, provavelmente devido à possibilidade de Chaplin
satirizar os investigadores através de seus personagens na tela.
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Cena de Monsieur Verdou - 1947 |
Os últimos filmes de Chaplin foram produzidos em Londres: A King in New York (1957) e A Countess from Hong Kong (1967), estrelado por Sophia Loren e Marlon Brando, no qual Chaplin faz uma ponta no papel de mordono - sua última aparição nas telas. Ele também compôs as trilhas para esses dois filmes, que inclui a canção tema de A Condessa de Hong Kong - "this is my song" - cantada por Petula Clark e que se tornou a canção mais executada no Reino Unido na época do lançamento do filme.
Em seus últimos anos, juntamente com
James Eric, Chaplin compôs músicas originais para seus filmes mudos e depois os
relançou. Compôs a música de seus outros curtas metragens produzidos pela First
National: The Idle Class em
1971, Pay Day em
1972, A Day’s Pleasure em
1973, Sunnyside em 1974, e
dos longa-metragens The Circus em 1969
e The Kid em 1971. O
último trabalho de Chaplin foi a trilha sonora para o filme A
Woman of Paris (1923), concluída em 1976, época em que Chaplin já estava com a
saúde bastante debilitada e com alguma dificuldade de comunicação.
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